Afinal de Contaslivros – Afinal de Contas http://afinaldecontas.blogfolha.uol.com.br por Marcelo Soares Mon, 31 Oct 2016 12:55:38 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=4.7.2 Uma dieta de informação menos calórica faz bem http://afinaldecontas.blogfolha.uol.com.br/2012/06/23/uma-dieta-de-informacao-menos-calorica-faz-bem/ http://afinaldecontas.blogfolha.uol.com.br/2012/06/23/uma-dieta-de-informacao-menos-calorica-faz-bem/#comments Sat, 23 Jun 2012 14:19:11 +0000 http://f.i.uol.com.br/folha/homepage/images/16244531.jpeg http://afinaldecontas.blogfolha.uol.com.br/?p=473

Se você acessa muito a internet, sabe que existe informação que é como isoporitos: não tem valor nutritivo nenhum, mas se bobear a gente consome sem parar. Podem ser vídeos de gatos arteiros. Podem ser tweets de subcelebridades. Podem ser reality shows na TV, essa perda de tempo que gera muitos pontos no ibope e muitos pageviews em toda a internet brasileira. Você sabe que não tem “sustança”, mas consome mesmo assim.

Eu sei como é: sei todos os detalhes de cada formação do Deep Purple e de muitos universos paralelos dos gibis de heróis. São meus passatempos prediletos. O Chico Buarque gosta de impressionar os amigos com escalações de times dos anos 50. Cada um tem seu isoporito.

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Existe informação que é como salada: vem crua, mal e mal tem um temperinho, dá mais trabalho para digerir e tem um alto valor nutritivo. Essa informação pode estar nas planilhas do Censo, por exemplo. E também existe informação que é como um prato bem preparado: pega a informação crua, mistura cuidadosamente com outras informações, capricha na apresentação. Reportagens bem feitas são assim.

Essa comparação entre calorias nutritivas (ou não) e calorias informativas (ou não) vem de Clay Johnson, em seu livro “A Dieta da Informação“, recém-lançado no Brasil. Li o original no começo do ano, quando estava começando a perder peso basicamente por anotar (e portanto prestar atenção em) cada coisa que comia. Fez todo o sentido do mundo.

Tanto nos alimentos quanto na informação, houve uma explosão recente na oferta. Cada vez temos maior abundância – e o naco mais barato e mais fácil de obter tem menor valor nutritivo. É mais fácil, rápido e barato “almoçar” uma coxinha no bar da esquina do que almoçar um bom bife com salada – assim como é mais fácil ler sobre a última escapadela de celebridades do que mergulhar em informações que revelam dados sobre a população.

Segundo Johnson, a epidemia de obesidade de informação tem consequências tão complicadas para a saúde da cidadania quanto a epidemia de obesidade metabólica tem para a saúde de uma população. Mas ele sugere algumas formas de evitar:

  • Consuma conscientemente – saiba que tipo de informação está consumindo; tudo bem consumir besteira, desde que não seja o prato principal
  • Mantenha limpo – corte o acesso automático a fontes que só tomam tempo sem dar muito benefício
  • Consuma localmente – procure se manter informado sobre o que acontece na sua cidade ou no seu bairro; é tão importante quanto o que rola em Brasília, e mais relevante porque afeta diretamente sua qualidade de vida. Além disso, quanto mais distante está a informação, mais atenção você precisa prestar ao quanto ela foi processada até chegar a você
  • Baixo teor de anúncios – quanto menos exposto você estiver a distrações, especialmente aquelas que querem seu dinheiro, melhor, né?
  • Diversidade – procure não ler apenas quem concorda com você. Informação é diferente de afirmação. Eu, particularmente, evito ler os mais radicais; a vida é curta demais pra maltratar tanto o fígado
  • Equilíbrio – numa refeição balanceada, você equilibra as quantidades de carnes, arroz, feijão, salada, sobremesa e bebida. Numa dieta de informação balanceada, você balanceia o que lê – livros, gibis, sites de fofoca, jornais, informação bruta. Não precisa cortar nada, mas cada minuto além do razoável em que você assiste a um reality show é um minuto a menos além do razoável em que você lê um livro.

Johnson é um dos criadores do software RescueTime, que registra e classifica o tipo de informação que você consome na internet, mostrando quanto tempo você perde. Eu uso e acho fascinante.

Por isso, e pelo fato de o original ter saído pela editora de livros técnicos O’Reilly, eu esperava que o livro fosse um pouco mais técnico. Às vezes, a leitura resvala na auto-ajuda. O autor às vezes estica demais sua metáfora, também. Como li a edição original, não tenho o que dizer sobre a qualidade da tradução brasileira.

De qualquer maneira, as dicas são muito boas. Recomendo muito o livro, especialmente se você é estudante ou professor de qualquer coisa.

Qual o seu isoporito de informação favorito e como você lida com a sobrecarga de informação? Conte aqui nos comentários.

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De graça: o Manual do Jornalismo de Dados http://afinaldecontas.blogfolha.uol.com.br/2012/05/03/de-graca-o-manual-do-jornalismo-de-dados/ http://afinaldecontas.blogfolha.uol.com.br/2012/05/03/de-graca-o-manual-do-jornalismo-de-dados/#respond Thu, 03 May 2012 18:14:00 +0000 http://f.i.uol.com.br/folha/homepage/images/16244531.jpeg http://afinaldecontas.blogfolha.uol.com.br/?p=275 Saiu nesta semana a versão em inglês, gratuita e na Web, do Data Journalism Handbook. Trata-se de um livro feito com a colaboração de vários jornalistas do mundo inteiro com alguma experiência no tratamento jornalístico de dados.

O livro reúne dicas e exemplos para quem quer conhecer melhor como funciona essa coisa de entrevistar números como se entrevista pessoas e depois fazê-los falar usando gráficos interativos ou não.

Alguns artigos têm uma importância grande até para quem não pretende produzir nada com massas de dados, apenas compreender melhor o que lê. É o caso do artigo “Become data literate in 3 simple steps“, de Nicolas Kayser-Bril.

É um pequeno guia para ler números que viram notícia. Resumo aqui:

1. Como os dados foram coletados?
“Quando a performance está ligada à produtividade, por exemplo, policiais têm um incentivo para registrar o máximo possível de incidentes que não exigem investigação. Um crime assim é o uso de maconha. Isso explica por que crimes relacionados às drogas na França quadruplicaram nos últimos 15 anos enquanto o consumo permaneceu constante. Quando duvidar da credibilidade de um número, sempre cheque duas vezes, como você faria se fosse uma aspa de um político.”

2. O que se pode descobrir aí?
“Na média, 1 em cada 15 europeus é completamente analfabeto. Essa manchete parece assustadora. Também é completamente verdadeira. Entre os 500 milhões de europeus, 36 milhões provavelmente não sabem ler. Aliás, 36 milhões também têm menos de 7 anos de idade. Quando for escrever sobre uma média, sempre pergunte a si mesmo: ‘média de quê?’ A população de referência é homogênea? Os padrões desiguais de distribuição explicam por que a maior parte das pessoas dirige melhor do que a média, por exemplo. Muita gente tem zero ou apenas um acidente durante a vida inteira. Alguns motoristas inconsequentes têm muitos acidentes, jogando o número médio de acidentes para muito mais alto do que a maior parte das pessoas experimenta. O mesmo é verdade na distribuição de renda: muita gente ganha menos do que a média.”

3. O quanto essa informação é confiável?
“Matérias sobre os benefícios de beber chá são lugar comum. (…) Embora os efeitos do chá sejam seriamente estudados por alguns, muitas pesquisas deixam de levar em conta fatores do estilo de vida, como a dieta, a profissão ou a prática de esportes. Na maior parte dos países, o chá é uma bebida comum entre classes mais altas e mais conscientes em relação à saúde. Se os pesquisadores não levarem em conta os fatores de estilo de vida nos estudos do chá, eles não estarão dizendo nada além de ‘os ricos são mais saudáveis – e eles provavelmente bebem chá’. A matemática por trás das correlações e margens de erro nos estudos do chá está certamente correta, ao menos na maior parte do tempo. Mas, se os pesquisadores não procurarem outras co-correlações (tipo como beber chá se correlaciona à prática de esportes), seus resultados têm pouco valor.”

Este último ponto é particularmente importante.

Ontem, fui almoçar com colegas de uma editoria especializada aqui da Folha. Um deles me contou de uma entrevista que fez com um pesquisador, segundo o qual determinado fenômeno tinha tido uma redução de 1.500%. O colega sabia que nada pode cair mais do que 100% – uma queda de 1.500% significa perder tudo o que tem e ficar devendo 14 vezes tudo o que tinha antes da queda -, e portanto deixou essa informação inútil e enganosa fora da reportagem. Jornalista ligado protege até a fonte de passar ridículo.

A queda real: 97%, o que é bastante significativo. Desde que o pesquisador soubesse usar uma trena corretamente para medir as distâncias. Espera-se que sim.

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