Apenas uma mulher das seis que concorriam ao segundo turno foi eleita na noite deste domingo (30). Com isso, temos os resultados completos para calcular uma espécie de “funil” eleitoral por sexo. O resultado, antecipo, não é ruim: a chance de uma mulher ser eleita prefeita é semelhante à chance de ser a candidata.
Existem leitores que ficam incomodados com esse tipo de comparação; consideram que é “criar rivalidade” entre homens e mulheres. Já eu acho que é uma questão puramente estatística: se metade da população é de mulheres, e na verdade é pouco mais do que a metade, deveria ser natural que metade dos representantes fossem mulheres. Se não são, é porque há outros fatores em jogo. E isso é uma questão importante de observar.
Ainda tenho a impressão de que muitas candidatas, especialmente no interior, são filhas ou mulheres de políticos tradicionais. Raquel Lyra (PSDB), a única mulher eleita no segundo turno, é um exemplo disso: é filha de João Lyra Neto, ex-governador de Pernambuco. Mas não conheço um levantamento mais completo sobre isso.
Enfim, vamos olhar os números. Das 2.156 mulheres que se candidataram, 640 viraram prefeitas.
Caso olhemos esse número como proporção das que se candidataram, parece muito ruim: apenas uma a cada vinte das candidatas se elegeram, em comparação a um a cada três dos homens.
Caso olhemos esse número como proporção do total, tanto de candidatos quanto de eleitos, temos uma divisão bem interessante: a proporção de eleitos é quase semelhante à de candidatos, nos dois sexos.
Isso é um bom resultado: indica as chances de uma mulher se eleger para uma prefeitura são relativamente proporcionais às chances de ser escolhida para concorrer. (Como cada coligação só pode indicar um candidato por cidade, seria estranho falar em cotas.)
Essa proporção melhorou bastante com o tempo. Em 2004, as mulheres eram 10% dos candidatos a prefeito e 7% do total de eleitos. Em 2012 e 2016, a proporção ficou mais igualitária: elas foram cerca de 13% do total de candidatos e cerca de 12% do total de eleitos.
Na disputa para vereador, a questão é mais complicada. Falei sobre isso na minha última coluna para o impresso, há quase um mês.
Desde 2010, a lei exige que ao menos 30% das candidaturas apresentadas por um partido sejam de mulheres. Mas, com toda sua variação regional, muitos diretórios partidários acabam tratando a apresentação das candidaturas femininas como mera formalidade.
Há vários artifícios usados para cumprir a cota só para juiz ver. Eles sabem que o julgamento das candidaturas vai demorar. Até lá, as candidaturas já foram negadas ou a candidata desistiu. O ministro Marco Aurélio Mello, grande frasista, classificou esse artifício como “candidatas-laranja”.
Neste ano, as mulheres foram um terço dos candidatos e 13,5% dos eleitos para vereador. A proporção de eleitas continua rigorosamente a mesma desde 2004, quanto não havia cotas.
Na segunda eleição municipal desde a criação da cota eleitoral de 30% de candidaturas de mulheres para o Legislativo, o “funil” das candidaturas alargou na boca, mas não avançou no bico. Ou seja: mais mulheres se candidatam mas proporcionalmente a mesma quantidade se elege.
Nas câmaras municipais, pelo menos desde 2004 não há mudança no “bico”. A boca é a mesma desde 2012, primeira eleição com cotas, e o bico é o mesmo desde ao menos 2004, antes das cotas.
Devido aos artifícios usados pelos diretórios, não dá para concluir dos resultados da eleição para vereador que as cotas para mulheres não funcionam. Especialmente se olharmos os resultados da eleição para os Executivos municipais, onde não há cota.
Talvez, ao deixar claro que as mulheres são bem-vindas à política, a cota tenha ajudado a aumentar a participação e a taxa de sucesso feminina na disputa para o Executivo, onde não há como colocar cotas visto que cada partido só lança um candidato por pleito.