Afinal de Contasolho no voto – Afinal de Contas http://afinaldecontas.blogfolha.uol.com.br por Marcelo Soares Mon, 31 Oct 2016 12:55:38 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=4.7.2 As pesquisas e a importância do horário eleitoral gratuito http://afinaldecontas.blogfolha.uol.com.br/2012/07/23/pesquisas-e-horario-eleitoral/ http://afinaldecontas.blogfolha.uol.com.br/2012/07/23/pesquisas-e-horario-eleitoral/#comments Mon, 23 Jul 2012 18:12:08 +0000 http://f.i.uol.com.br/folha/homepage/images/16244531.jpeg http://afinaldecontas.blogfolha.uol.com.br/?p=649 O Datafolha publicou no final de semana a mais nova pesquisa de intenção de votos para prefeito de São Paulo e outras capitais. Aqui, a grande surpresa foi o empate técnico entre José Serra (PSDB) e Celso Russomanno (PRB).

Claro que gerou polêmica. Russomanno, favorito dos evangélicos, atribui seu crescimento aos ataques entre os dois principais partidos nacionais: “Enquanto PT e PSDB se atacam, estou trabalhando“, disse ele. Serra disse que aposta no horário eleitoral para subir mais. Petistas viram no resultado da pesquisa um sinal do racha na campanha e convocaram a mulher de Fernando Haddad para participar da campanha.

A história que as pesquisas contam hoje é esta:

Antes de bater o martelo sobre o que isso significa para o resultado da eleição, é preciso olhar em que dia estamos. Estamos em 23 de julho? Bom, falta pouco menos de um mês para o horário eleitoral.

LEIA MAIS
Serra e Russomanno lideram disputa pela prefeitura de SP (Folha, 21.jul.2012)
Maluf usa ação na Justiça como estratégia (Folha, 24.ago.2000)
Acervo de pesquisas eleitorais (Fernando Rodrigues)

O horário eleitoral começa só em 21 de agosto. Antes disso, as pesquisas só conseguem captar o quanto os candidatos são conhecidos. São importantes para os partidos definirem que foco dar à sua campanha, mas antecipam muito pouco o comportamento que o eleitor terá na frente da urna em outubro.

Descobri isso na prática em 2000, quando participei da cobertura da eleição municipal aqui na Folha. O gráfico abaixo conta a história daquela campanha segundo o Datafolha. Perceba como os candidatos se “embolam” depois que começa o horário eleitoral. Não há candidato que fique indiferente.

Até junho do ano eleitoral, as pesquisas testam a popularidade dos nomes que os partidos podem apresentar. Quanto mais perto de junho, mais definidos. Sempre pode haver uma desistência durante as convenções, que ocorrem ao longo do mês, para apoiar candidaturas mais populares.

A campanha nas ruas começa dia 5 de julho. Entre esse dia e o começo do horário eleitoral, as pesquisas também captam basicamente o quanto os candidatos definidos são conhecidos. Não muda muito a ordem dos fatores.

Tudo muda de figura depois que começa o horário eleitoral e a propaganda dos candidatos na TV. Como descobriu Richard Nixon no primeiro debate televisionado dos EUA, em 1960, a TV pode fazer e desfazer favoritismos.

Por mais que a maior parte dos eleitores diga desligar a televisão durante o espaço dedicado aos candidatos, ao longo da transmissão do horário eleitoral candidatos desconhecidos se tornam conhecidos e indecisos começam a decidir. Aqui, os marqueteiros e os criativos fazem sua festa.

É por isso, e basicamente por isso, que Lula fechou aliança entre o seu PT e o PP de Paulo Maluf. O 1 minuto e 43 segundos ofertado pelo partido do ex-prefeito garante a Fernando Haddad um total de 7 minutos e 35 no horário eleitoral dos prefeituráveis, segundo a projeção feita pela Folha. Nove segundos a menos que Serra – então, a disputa entre os dois na TV será direta.

Na eleição de 2000, Geraldo Alckmin (PSDB) era praticamente desconhecido antes do início do horário eleitoral. Quando começou a campanha, começou a aparecer e a crescer. Em dado momento, chegou a ficar em segundo lugar no Datafolha.

O melhor termômetro do quanto um candidato está crescendo nas pesquisas é o volume de processos movidos pelos outros candidatos contra ele na Justiça Eleitoral. Esses processos visam tirar minutos de propaganda desses candidatos, para evitar que cresçam. Parte importante do meu trabalho em 2000 era acompanhar esses processos. Percebi que Maluf, em segundo lugar nas pesquisas, vinha se tornando o campeão em processar os oponentes.

Um dia, recebi do advogado da Folha a dica de que Paulo Maluf havia montado um escritório apenas para monitorar o que seus concorrentes diziam sobre ele. Visitei o escritório, com o então fotógrafo João Wainer. Era um andar inteiro no Itaim. Uma sala tinha uma TV ligada em cada canal. Cada TV com um estagiário atento e um videocassete gravando a programação inteira. Noutra sala, estagiários monitoravam o rádio. Noutra, havia exemplares de jornal sublinhados de acordo com um código de cores.

No instante em que alguém falasse algo, seus advogados colocavam a fita de VHS na garupa de um motoboy para protocolar o processo na Justiça Eleitoral.

Alckmin só se manteve em segundo lugar por uma edição da pesquisa. Mas começou em último e terminou em terceiro. No meio do caminho, adotou a prática de contra-atacar Maluf.

Você pode dizer que é história antiga. Mas veja como as pesquisas Datafolha contam a história da eleição de 2008, em que o mesmo Alckmin começou como favorito.

Kassab, o atual prefeito, estava em terceiro lugar nas pesquisas logo no começo. Quando começou o horário eleitoral gratuito, Kassab foi galgando posições e Alckmin foi perdendo espaço. Ao final do primeiro turno, Kassab estava em segundo. No segundo turno, ganhou de Marta Suplicy. O resultado são os últimos quatro anos.

Tudo isto para lembrar que é muito difícil prever com segurança o resultado de uma eleição apenas a partir das pesquisas eleitorais publicadas antes do horário eleitoral gratuito.

Lembre disso antes de brigar com seus amigos na mesa de bar. Nossos caríssimos políticos brigam à vontade e depois viram amigos de infância em nome do horário eleitoral.

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Palavra de especialista: protesto mesmo é não votar http://afinaldecontas.blogfolha.uol.com.br/2012/07/19/nao-votar/ http://afinaldecontas.blogfolha.uol.com.br/2012/07/19/nao-votar/#comments Thu, 19 Jul 2012 15:07:02 +0000 http://f.i.uol.com.br/folha/homepage/images/16244531.jpeg http://afinaldecontas.blogfolha.uol.com.br/?p=618 Recebi hoje um e-mail muito interessante de Ricardo Ceneviva, professor da disciplina de Métodos e Técnicas de Pesquisa em Ciência Política na USP. Pesquisador do Centro de Estudos da Metrópole, do Cebrap, ele conhece os dados municipais como poucos no Brasil.

Ele leu o post sobre o voto nulo e enviou uma análise que fez da participação do eleitor em 2008. Segundo ele, os dados oficiais mostram que a média de ausência às eleições (quase 12%) é bem maior do que as médias de brancos (2%) e nulos (quase 7%) somadas. Em alguns municípios, quase um terço dos eleitores faltou à eleição.

LEIA MAIS
A lenda do voto nulo (15.jul)
Como ler um ‘ranking da corrupção’ (11.abr)
As marchas são um bom sinal (6 de junho)
Lei eleitoral (9.504/97)
Dados de eleições anteriores (TSE)

Se os votos nulos podem indicar que houve anulação dos votos recebidos por candidatos impugnados (ou em parte que o eleitor errou na hora de digitar, como acredita Alberto Carlos de Andrade), a alta ausência às urnas está mais ligada a uma opção do eleitor. Ela pode se dever à combinação destes fatores:

  • Tempo (deu praia, choveu etc);
  • Impedimento (viagem, doença, acidente);
  • O eleitor não teve a menor vontade de ir às urnas no dia da eleição;
  • O eleitor mudou de cidade ou país e não transferiu o título, então ele justifica ausência, sem pagar multa, ou topa pagar a multa quando precisar;
  • O eleitor morreu e não foi retirado do cadastro eleitoral (uma minoria).

Embora não ir votar não resolva o problema da má representação, porque os maus políticos sempre terão votos, Ceneviva afirma que isso é um excelente argumento pelo voto facultativo. Quando o voto é um direito, e não uma obrigação, votam os que se sentem motivados para escolher (seja qual for o motivo, e isso inclui maus motivos).

“O  direto de votar e participar da vida política da cidade (ou do país) não deveria ser confundido com a obrigação de votar”, diz ele. O direito de não votar deveria ser garantido especialmente quando “o benefício esperado do voto – a probabilidade de que meu voto seja decisivo para eleger meu candidato – me parece muito menor do que o  custo de me informar sobre os candidatos e votar”.

Ceneviva acredita que muitos brasileiros continuam votando apesar da descrença na classe política porque desconhecem o baixo custo de regularizar sua situação caso deixem as urnas de lado. Sempre que as autoridades lembram que o voto é obrigatório, mencionam que os ausentes às urnas podem ser impedidos de fazer concurso público, por exemplo, mas poucos sabem que custa no máximo R$ 3,51 a multa para regularizar a situação.

O pesquisador também comenta o “não reeleja ninguém” e diz que os dados mostram que ele ao mesmo tempo funciona, porque há uma rotatividade alta no Legislativo, e não funciona, porque a situação não muda:

“A taxa de renovação na Câmara dos Deputados tem sido historicamente de cerca de 50% dos deputados a cada nova legislatura. Uma taxa muito alta, se comparada com outras democracias. Nos EUA, por exemplo, a taxa de reeleição dos deputados é de cerca de 90% no Congresso. Como você escreveu, de nada adianta trocar as pessoas se as instituições (a estrutura de incentivos) continua a mesma.”

Você pode baixar aqui, em inglês, um estudo em que Ceneviva estuda a vantagem desfrutada por prefeitos que concorrem à reeleição no exercício do cargo. É baixa, ele já adianta. Talvez porque o prefeito seja o ator político mais próximo do cidadão – qualquer besteira que ele faça no cargo é sentida na pele, especialmente em cidades pequenas.

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A lenda do voto nulo http://afinaldecontas.blogfolha.uol.com.br/2012/07/15/a-lenda-do-voto-nulo/ http://afinaldecontas.blogfolha.uol.com.br/2012/07/15/a-lenda-do-voto-nulo/#comments Sun, 15 Jul 2012 14:59:36 +0000 http://f.i.uol.com.br/folha/homepage/images/16244531.jpeg http://afinaldecontas.blogfolha.uol.com.br/?p=594

Todo ano de eleição, circulam correntes pela internet com saídas supostamente mágicas para forçar a política a ser exercida com moralidade. As duas principais balas de prata sugeridas nessas correntes são ninguém reeleger político nenhum e todo mundo votar nulo.

Eu detesto correntes de internet, por mais bem intencionadas que sejam. Embora a intenção seja sempre boa (só está contente com a nossa representação quem está muito por fora ou muito por dentro), falta um pouco de noção a essas propostas. Como, de resto, falta noção a qualquer corrente de internet.

LEIA MAIS:
Como ler um “ranking da corrupção” (11 de abril)
O campo de batalha da Web é o seu tempo (24 de abril)
As marchas são um bom sinal (6 de junho)
Uma dieta de informação menos calórica faz bem (23 de junho)
Voto nulo não invalida eleição, diz Marco Aurélio (Folha, 6.set.2006)
Lei eleitoral (9.504/97)
Dados de eleições anteriores (TSE)

Perceba que as duas opções são razoáveis individualmente. Se você conhece um candidato que nunca exerceu mandato nenhum e o acha sério, é plenamente razoável tentar elegê-lo. Se você, por outro lado, não achou nenhum candidato que preste, é plenamente razoável anular seu voto. Mas é difícil combinar com gente suficiente pra não reeleger ninguém ou para todo mundo votar nulo.

Por quê? Os políticos que você não quer ver eleitos sempre acabarão tendo uma razoável quantidade de votos, seja por popularidade ou por outros expedientes.

Não reeleger ninguém não é por si garantia de melhor representação. Você pode trocar as moscas à vontade – se mantiver a iguaria que as atrai, no caso todos os incentivos à falta de transparência e ao abuso do poder, tanto faz se as moscas são velhas ou novas. No limite, o “não reeleja ninguém” deu uma bela força à eleição do novato Tiririca. Parabéns aos envolvidos, né? Sucesso absoluto.

Mas é do voto nulo que eu queria falar aqui, seguindo mote dado pelo amigo Jener Gomes, interlocutor de alguns dos melhores papos do meu tempo de faculdade.

Já votei nulo algumas vezes na vida. Acho uma opção pessoal válida, desde que se tenha consciência de que isso implica em ter seu voto simplesmente desconsiderado. O que elege um candidato são os votos válidos; quem votou nulo, branco ou não foi votar simplesmente lavou as mãos e deixou os outros escolherem. Em 2006, o ministro Marco Aurélio de Mello disse à Folha que voto nulo não anula eleição.

Vamos analisar os votos nulos primeiro com matemática simples e depois com um caso concreto que virou corrente.

1) Matemática

Digamos que a cidade de São Longuinho do Passa Longe tenha 1.000 habitantes. Lá, vive o candidato Huguinho, dono de uma notória fama de ladrão. Também concorrem os candidatos Zezinho, com fama de burro, e Luizinho, sem fama de nada e também sem votos.

O candidato Huguinho tem 200 apoiadores garantidos – sejam amigos seus, pessoas que concordam com suas ideias ou parentes de funcionários dele –  e consegue comprar o apoio de outros 100 eleitores. Com isso, ele tem 30% dos votos da cidade. Sua eleição não está garantida, por isso ele bota carros de som na cidade tocando Michel Teló a todo volume e gritando seu nome aos quatro ventos. Isso pode lhe garantir talvez 50 votos de indecisos, com sorte.

Agora, digamos que um líder comunitário de Passa Longe, muito bem intencionado, resolva criar um movimento de voto nulo contra os maus políticos da cidade. Com muito esforço, ele consegue convencer 300 eleitores a topar sua proposta. Excelente – é o número de eleitores que Huguinho, o grande motivador da campanha pelo voto nulo, tem garantidos. Sucesso?

No dia da eleição, abrem-se as urnas. Este é o resultado:

Huguinho – 310 votos
Zezinho –  190 votos
Luizinho – 100 votos (na esteira do “não reeleja ninguém”)
Brancos – 100 votos
Nulos –  300 votos

Brancos e nulos não contam para o resultado de uma eleição. Contam os válidos. Para vencer, em cidades pequenas como Passa Longe, o sujeito precisa ter apenas mais votos que os outros. Só em cidades com mais de 200 mil eleitores é preciso ter mais da metade dos votos para ganhar sem segundo turno. Ou seja: numa capital, com a proporção de votos  com que X ficou com a campanha do voto nulo, ele seria eleito no primeiro turno.

Se todos tivessem votado em alguém, X teria tido 31% dos votos. Com a ajuda de brancos e nulos, porém, X teve 51,7% dos votos válidos. Parabéns aos criadores da campanha: deram a maior força para quem não queriam ver eleito.

2) Corrente

A corrente que recebi hoje pela manhã no Facebook louvava a consciência cívica do povo de Bom Jesus de Itabapoana, no norte do Rio de Janeiro. Eles teriam anulado quase nove em cada dez votos na eleição de 2008, forçando uma nova eleição.

Será que era isso mesmo? Claro que nunca é bem assim. Por partes:

a) Sim, houve 89,2% de votos nulos na cidade. Isso porque os dois candidatos mais populares tiveram suas candidaturas indeferidas e concorreram amparados por liminares. Só que as liminares caíram antes da votação. Todos os votos depositados para eles foram considerados nulos, mas quem votou neles votou em alguém. Não acho que votar em candidatos indeferidos seja uma lição de cidadania, como quer a corrente.

b) O vencedor ficou sendo o terceiro colocado, que teve 6% dos votos. Isso não representa exatamente a vontade do eleitorado, embora em muitos lugares seja o que prevalece quando os candidatos são sucessivamente eliminados por conta de irregularidades. Ainda em maio, no Piauí, tomou posse uma vereadora eleita com apenas um voto, porque os eleitos antes dela foram cassados.

c) Inicialmente, ainda em outubro de 2008, a Justiça Eleitoral do Rio pensou em fazer novas eleições. Isso tem custo, que sai do bolso do contribuinte. Só que a Justiça Eleitoral é um caso raro no ambiente institucional. Ela é ligada ao Judiciário, mas tem funções dos três Poderes em época de eleição. Legisla, por meio das resoluções. Executa, administrando as eleições. E julga os casos de conflito. Assim, é bastante comum ela levar em conta o custo de administrar nova eleição para decidir conflitos, decidindo do jeito menos trabalhoso.

(Ainda que decidisse por uma nova eleição, não se iluda: os candidatos sairiam do mesmo ambiente político que gerou os candidatos cassados. Os partidos são os mesmos. Os grupos de influência são os mesmos. As oligarquias, também as mesmas. Mas enfim.)

d) Em dezembro de 2008, o Tribunal Superior Eleitoral se manifestou. O ministro Eros Grau decidiu que uma das candidatas bem votadas e impedidas de concorrer poderia receber os votos e ganhar a eleição. Apoiou-se numa tecnicalidade: suas contas foram rejeitadas, sim, mas no momento do registro da candidatura ela não havia ainda sido condenada por isso.

e) Essa candidata que foi impedida de concorrer e depois eleita prefeita continua no cargo até hoje. Neste ano, ela é candidata de novo. Sua candidatura aguarda julgamento. O outro candidato que teve seus votos anulados em 2008 também concorre de novo neste ano.

Mas então, o que fazer?

Se você decide escolher algum, as opções são aquelas que você acha ruins.

Se você não participa da escolha, outros escolhem por você.

A única certeza é a de que o cargo disputado NÃO ficará vago e que o ocupante vai tomar decisões que afetam sua vida – ou pelo menos seu bolso. Seja quem for eleito, ele ou ela vai representar você – por menos que você goste da ideia.

Ninguém disse que viver numa democracia era necessariamente fácil, enfim. Num próximo post, exploro algumas possibilidades de fiscalização com o uso de dados.

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